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segunda-feira, 28 de julho de 2014

Casos de idosos infectados pelo HIV aumentam no Brasil

Especialistas alertam que casos de idosos infectados pelo HIV têm aumentado nos últimos anos no Brasil. A falta de abertura para falar sobre a sexualidade e o excesso de confiança no parceiro estão entre as razões do problema
Correio Braziliense

“No tempo deles, ninguém vivia até os 60 anos. Hoje, vamos até 80, 90, e o idoso quer aproveitar. Está tudo muito mais fácil do que quando as mulheres tinham que ser muito reservadas, por exemplo. E outra coisa: acham que não pega em velho. Pensam que, se pegar, já está morrendo mesmo. Mas não é uma morte fácil.” O relato é de Jussara Santos, 63 anos, presidente da Fraternidade Assistencial Lucas Evangelista (Fale), entidade que abriga soropositivos no Distrito Federal. Nos últimos 10 anos, ela percebeu o início de uma mudança na faixa etária das pessoas que buscam assistência na comunidade fundada há mais de 20 em uma chácara do Recanto das Emas. Se no início eram muitos jovens homossexuais, agora surgem idosos. “Não sei dizer exatamente o que mudou. É como se, de repente, eles se percebessem livres e se esquecessem de se cuidar”, arrisca.

Um fato: muitas coisas mudaram entre as experiências vividas pelos jovens de 20 e poucos anos na década de 1970 e a realidade de um idoso aos 65 em 2014. Nesse período, turbulentos e polêmicos episódios alteraram permanentemente o que era esperado por aquele setentista como um “envelhecimento tradicional”. O divórcio, por exemplo, foi oficialmente instituído em 1977 no Brasil. Até meados dos anos de 1980 — quando surgiram os primeiros casos de Aids —, a camisinha era utilizada somente como método contraceptivo. E, apenas em 1998, foi aprovado o primeiro remédio oral para a disfunção erétil pela agência de vigilância sanitária dos Estados Unidos, a FDA.

A epidemia começa a envelhecer. Ao mesmo tempo em que as conquistas sociais fortaleceram o direito à sexualidade, idosos soropositivos expostos ao vírus, por eficácia do tratamento, têm sobrevida muito mais extensa do que no início dos contágios. “Mas, conscientizar essa faixa etária para o uso do preservativo é muito difícil”, aponta a coordenadora de DST/Aids do Pará e especialista na área, Deborah Maia Crespo. “Principalmente nessa faixa etária, é colocado todo um estigma de conduta e postura que favorece um cenário de rejeição familiar quando o idoso é vítima de exposição ao vírus”, completa. Ela conta que os relatos sempre trazem histórias de pessoas que contraíram a doença de um parceiro no qual confiavam e achavam que, por esse motivo, não precisavam se proteger.

Essa é a história de Olga*, moradora da Fale há alguns anos. Aos 55, ela não sabe dizer exatamente quando foi infectada, mas que o marido já manifestava sinais da doença antes que ela soubesse da própria soropositividade. O companheiro não resistiu aos danos causados pelo avanço da Aids. Hoje, Olga fala com desenvoltura sobre o preconceito e a dificuldade que enfrentou. Mas Crespo ressalta que esse desembaraço é pouco comum. Até mesmo o questionamento em consultório sobre a sexualidade do paciente idoso ainda é visto como tabu. “Imagine um profissional de saúde que solicita um exame de HIV. Vai ouvir: ‘você está me julgando como o quê?’ Quando, na verdade, não deixa de ser apenas uma doença sexualmente transmissível.”

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